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Pancs são alternativa para alimentação mais saudável

12/09/2016 19h56 | Atualizado em: 12/09/2016 20h07

Cebola, cenoura e alho vieram da Ásia Central. Beterraba, repolho e aipo, do Centro-Mediterrâneo, nas proximidades da Turquia e Grécia. O pêssego, a laranja e a maça, da China.

Quase todas as espécies de plantas que consumimos hoje em dia nos chegaram através do deslocamento das populações humanas pelo planeta, principalmente em busca de terras e comércio.

Mas existem Plantas Alimentícias Não-Convencionais (Pancs), que nascem espontaneamente em terrenos baldios, calçadas e beira de estradas.

Chamadas popularmente de inços, mato ou daninhas, são espécies nativas que, segundo a mestre em Nutrição Irany Arteche, podem substituir com vantagem nutricional produtos que teriam que ser comprados no supermercado ou fora safra. ”As folhas da taioba podem substituir a couve. A urtiga e a bertalha, o espinafre”.

Conforme Irany, são plantas espertas, de crescimento mais lento, que se viram para encarar o frio, calor, estresse hídrico (falta ou excesso de água) e parasitas. Por essas características, a disponibilidade de nutrientes é mais frequente.

“Até alguns nutrientes, na linha dos antioxidantes e fitoquímicos que muitas vezes não fornecemos para nosso corpo há tanto tempo, numa dessas plantas podemos acabar ingerindo para sanar uma célula doente, por exemplo”, exemplifica a nutricionista, ela mesma consumidora de urtiga, bertalha, e outras Pancs.

Taboa substitui palmito

Em Florianópolis, o estudante de Agronomia da Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc) Jefferson Pietroski da Mota começou a estudar por conta própria as Pancs. “Eu apenas divulgo. A UFSC em si ainda não tem nenhum projeto específico de resgate e utilização, mas alguns professores já utilizam”.

Uma das espécies divulgadas por Mota é a taboa (Typha domingensis), planta aquática que nasce em brejos e corpos d´água. A parte aérea pode ser queimada para obtenção de sal vegetal. O miolo, ou rizoma, é semelhante ao palmito e pode ser consumido cru ou cozido. O pólen é utilizado para fazer pães, biscoitos, colorir o arroz ou misturado ao mel.

O mestre em Botânica e doutor em Fitotecnia Valdely Ferreira Kinupp destaca que, refogado, o rizoma é tão gostoso quanto palmito. Já o pólen não é tóxico como outros pólens e tem alto teor de proteínas, lipídios, açúcares e vitamina C estável.

“Sofremos com imperialismo gastronômico”, diz biólogo

Sobre a dieta que a grande maioria das pessoas adota na atualidade, o biólogo considera que além do imperialismo cultural, sofremos com o imperialismo gastronômico alimentar. “Os alimentos que consumimos, mesmo a banana, em sua maioria são espécies exóticas, isto é, vieram de outros continentes, outras culturas”.

Para a nutricionista Irany diversos fatores contribuem para que as pessoas prefiram as plantas exóticas (todas as que não têm origem no Brasil e América do Sul) e não as nativas. “Um deles é o acesso, o que está disponível no mercado”.

Em seu trabalho, Irany observa que quando existe mercado ele é polarizado: ou de famílias que sempre consumiram ou mais elitizado, como por exemplo do premiado chef internacional Alex Atala, que usa frutos do bioma Cerrado, plantas do norte. “Ou é um consumo tradicional ou mais elitizado, porque os chefs estão sempre buscando o novo, o ineditismo.”

É importante conhecer e cultivar as PANCs

Outro fator considerado bastante importante para Irany é a pessoa conhecer para não confundir espécies comestíveis com não comestíveis. “Usar de terrenos baldios e que encontra, só se a pessoa realmente tem conhecimento”. Na opinião de Irany, o melhor é ter mudas disponíveis da variedade correta para as pessoa cultivar em casa. “Eu tenho urtiga, bertalha, eu plantei”.

O estudante de Agronomia Mota cita o trabalho com os frutos do palmiteiro-juçara (Euterpe edulis), como o início do uso de Pancs na Ufsc. “Esta espécie ocorre aí em Criciúma e está em extinção, porém seus frutos podem ser utilizados como o açaí do norte (são duas espécies Euterpe oleracea e Euterpe precatoria). Já fizemos algumas despolpas do fruto e os alunos provaram”.